Quando consumir proteína é bom ter o açúcar presente, na mesma refeição. Por queɁ
A relação que se estabelece entre o consumo de aminoácidos-glicose-insulina, tão esquecida pela nutrição/medicina, mas que, para a sua saúde, melhor não ignorar.
[Imagem: bbaum.ru]
[Este artigo já foi publicado no nosso antigo blog do substack ao qual, recentemente, me foi vetado o acesso para postar novas publicações. Dessa forma e para que possa ser conhecido pelos leitores deste novo blog - intitulado outramedicina2024.substack.com - , faço aqui a republicação do artigo]
Na prática, ocorre o seguinte quando a pessoa, em uma refeição, consome apenas proteína: a refeição será seguida de um pico de insulina.
Exemplo, se consumir gema de ovos pura, somente ovos: aminoácidos – especialmente aqueles dos ovos – estimularão a secreção de insulina, com a resultante hipoglicemia e esta, por sua vez, promoverá secreção de cortisol. E cortisol é um problema.
A insulina se elevará por uma razão metabólica conhecida: ela é parte da metabolização – aproveitamento – dos aminoácidos da proteína daquela refeição. A chegada de aminoácidos mobiliza necessariamente insulina [A].
Se a refeição traz frutose, por exemplo, ou sacarose, o resultado será que o açúcar tenderá a compensar a subida da insulina. Haverá uma relação compensatória e o resultado final será que quase não se altera o açúcar sanguíneo.
Aquela gema acima, acompanhada pelo suco de laranja doce, perfeito. Ou a carne da foto acima, cozida ou assada e acompanhada do mesmo suco de laranja.
É o fígado quem libera lentamente açúcar, garantindo os níveis do plasma. Ao consumir apenas proteína, um churrasco por exemplo, haverá um processo de hipoglicemia. E, neste caso, se o açúcar cair bruscamente, vamos depender de bons depósitos de glicogênio hepático ou o cortisol entrará em ação. E o problema está em que, hoje em dia, pouca gente tem fígado saudável, que acumule glicogênio [reservas de açúcar].
“É o fígado quem libera glicose para manter o açúcar do sangue fluindo, de forma que cérebro, hemácias e rins etc. possam continuar operantes. E se o fígado da pessoa armazena, de alguma forma, pouco glicogênio, então toda vez que a pessoa consome proteína, disparando secreção de insulina, o organismo secreta uma quantidade compensatória de cortisol para trazer o açúcar de volta aos níveis esperados. Mas o cortisol mantém o açúcar sanguíneo às expensas de proteína” [R. Peat], isto é, consumindo tecidos, começando pelo timo. Ou às expensas de parte da carne que chegou na refeição.
Se o açúcar não vier, ocorrerá a reação citada acima, pico insulínico, seguido de onda de cortisol. Este entrará em cena para sintetizar açúcar, para suprir o açúcar que não chegou de fora. E que a acaba de cair, pelo pico insulínico desencadeado pelos aminoácidos puros.
“Para manejar a proteína eficientemente, a pessoa precisa de glicose para assegurar que sua insulina não está baixando o açúcar sanguíneo. Precisa de glicose ou frutose para estabilizar o açúcar sanguíneo” [R. Peat].
O fato metabólico é que os aminoácidos da proteína, em si, são fortes estimulantes da secreção de insulina [A]. E uma onda de insulina tende a baixar o açúcar sanguíneo.
Mesmo o chocolate entra nessa regra: ele é muito rico no aminoácido leucina, daí quando a pessoa consome chocolate – amargo, sem açúcar ou o cacau puro - pode dar uma queda no açúcar. Por conta daquela relação aminoácidos- açúcar. “Vários dos aminoácidos das proteínas são poderosos estimulantes da insulina. E quando a pessoa consome a proteína em si, estimula a secreção de insulina, que é necessária para metabolizar os aminoácidos” [R. Peat].
“Consumir fruta, óleo de coco e sal na mesma refeição diminuirá esse efeito da proteína” [R. Peat].
“Sempre que a pessoa consumir uma grande dose de proteína sem açúcar para suportá-la, estará estimulando a secreção, em primeiro lugar, da insulina, para incorporar os aminoácidos digeridos da proteína. A insulina, que adequadamente, maneja os aminoácidos, tende a baixar a glicose circulante e também a transformá-la em gordura. Como a glicose cai, isso mobilizará cortisol.
Tipicamente, uma grande refeição proteica causará uma onda de cortisol. Algumas pessoas se tornam aparentemente diabéticas ou muito hipoglicêmicas apenas pelo fato de consomirem muita carne desacompanhada de açúcar” [R. Peat., Sugar 1, 09-10-17]. Sempre porque a pessoa não contou com açúcar na refeição ou então não possui reservas de glicogênio.
E observe-se bem o processo: quando o cortisol sobe disparado pela queda do açúcar, ele fará o que sempre faz, isto é, produzir açúcar a partir de proteína. Proteínas serão queimadas para virar açúcar. Ora, não é boa política metabólica queimar proteína para obter energia. Proteína não é bom substituto para açúcar. E gera amônia nesse processo.
“A reação insulina-cortisol possui efeitos cumulativos crônicos, envelhecendo células do cérebro, sistema imune e assim por diante. Por isso é muito importante não queimar proteína para obter energia. A pessoa precisa da proteína para ser usada como proteína e não como substituto para açúcar ou gordura” [R. Peat].
Proteína sem a companhia do açúcar se traduzirá, portanto, em desperdício de proteína. “Consumir muita proteína de uma vez, sem fruta fará com que haja um desperdício de um bocado da proteína. Já vi pessoas que consumiam mais que duas libras de carne por dia e que apresentavam sinais de uma deficiência proteica, com grandes quantidades de cortisol sendo produzidas e uma quantidade tremenda de aminoácidos na sua urina” [R. Peat].
Os que propõem uma dieta de carne – carnívoros estritos - que será evidentemente rica em nutrientes, entram nessa lista: ao não trazer o açúcar, tende a gerar, pelo mecanismo acima, queda no açúcar plasmático.
“A dieta dos caçadores, na qual a pessoa consome um monte de carne, que alguns evolucionistas propõem, resulta em que a carne, mesmo provendo as proteínas essenciais, não necessariamente traz a grande concentração de glicose e materiais para a metabolização da glicose. Isso tende a causar hipoglicemia.
Na verdade, quanto mais carne você consome, mais insulina secreta para manejar a disponibilidade proteica. E se a pessoa não está consumindo carboidrato [açúcar, na verdade, GD] então a carne vai promover um cortisol cronicamente aumentado e uma tendência em direção à hipoglicemia por conta da insulina mantida alta” [R. Peat].
Tanto faz se a refeição, além da proteína, somente contiver amido [sanduíche de carne e pão]. “Se a pessoa consome uma refeição que é proteína pura ou se come uma refeição com proteína e amido, no final de contas, haverá o mesmo processo. Haverá uma subida da insulina, que tende a conduzir a uma produção aumentada de gordura” [R. Peat]. Amido, facilmente, dá pico insulínico, por si mesmo.[ Ver nota sobre o amido neste blog]
É importante não consumir grande quantidade de proteína pura. “Tive a experiência de quase desmaiar após consumir apenas ovos para o breakfast, quando estava apressado, em um clima frio, e ouvi dizer que é comum para mulheres em dieta, quando elas consomem apenas ovos, desmaiarem cerca de uma hora depois por conta do fato de que a proteína do ovo é de qualidade muito alta e estimula a secreção de insulina, o que baixa o açúcar sanguíneo e isso mobiliza uma reação do cortisol muito intensa, podendo levar a desmaio” [R. Peat].
Em resumo, nas refeições, é estratégico ficar atento para garantir que a proteína pura venha associada a algum açúcar [pode ser mel de abelha, suco de laranja doce, sacarose], caso contrário, serão desencadeados processos metabólicos negativos para a saúde e o próprio envelhecimento.
G Dantas [Publicado originalmente em Brasília, 20-1-24]
As informações aqui presentes não pretendem servir para uso diagnóstico, prescrição médica, tratamento, prevenção ou mitigação de qualquer doença humana. Não pretendem substituir a consulta ao profissional médico ou servir como recomendação para qualquer plano de tratamento. Trata-se de informações com fins estritamente educativos. Nenhuma das notas aqui presentes, neste blog, conseguirá atingir o contexto específico do paciente singular, nem doses, modo de usar etc. Este trabalho compete ao paciente com seu médico. Isso significa que nenhuma dessas notas - necessariamente parciais - substitui essa relação.
Referência ___________________________
[A] SLOUN van B, GOOSSENS G H ERDOS B, 2020. The Impact of Amino Acids on Postprandial Glucose and Insulin Kinetics in Humans: A Quantitative Overview. Nutrients. 2020 Oct; 12(10): 3211. Published online 2020 Oct 21. doi: 10.3390/nu12103211 PMCID: PMC7594055 PMID: 33096658 “Different amino acids (AAs) may exert distinct effects on postprandial glucose and insulin concentrations. A quantitative comparison of the effects of AAs on glucose and insulin kinetics in humans is currently lacking. PubMed was queried to identify intervention studies reporting glucose and insulin concentrations after acute ingestion and/or intravenous infusion of AAs in healthy adults and those living with obesity and/or type 2 diabetes (T2DM). The systematic literature search identified 55 studies that examined the effects of l-leucine, l-isoleucine, l-alanine, l-glutamine, l-arginine, l-lysine, glycine, l-proline, l-phenylalanine, l-glutamate, branched-chain AAs (i.e., l-leucine, l-isoleucine, and l-valine), and multiple individual l-AAs on glucose and insulin concentrations. Oral ingestion of most individual AAs induced an insulin response, but did not alter glucose concentrations in healthy participants. Specific AAs (i.e., leucine and isoleucine) co-ingested with glucose exerted a synergistic effect on the postprandial insulin response and attenuated the glucose response compared to glucose intake alone in healthy participants. Oral AA ingestion as well as intravenous AA infusion was able to stimulate an insulin response and decrease glucose concentrations in T2DM and obese individuals. The extracted information is publicly available and can serve multiple purposes such as computational modeling”. Consumo de aminoácidos disparando resposta insulínica.
Mais elementos do mesmo artigo:
Introduction - Glucose is a key substrate for many different types of cells and tissues, and as such plays an important role in human metabolism [1]. Blood glucose concentrations are tightly regulated to prevent hypoglycemia and hyperglycemia, thereby ensuring normal body functions. Glucagon and adrenalin are the key hormones responsible for elevating blood glucose concentration (for example during fasting or exercise), whereas insulin lowers blood glucose concentrations (for example following meal intake) [2]. This complex regulatory system involves various organs, including the gut, pancreas, liver, adipose tissue and skeletal muscle. Impairment of glucose homeostasis increases the risk of developing chronic cardiometabolic diseases such as type 2 diabetes mellitus (T2DM) and cardiovascular disease, highlighting the importance of adequate control of blood glucose concentrations [3].
Amino acids (AAs) are involved in the regulation of insulin secretion through their effects on β-cells, causing a rise in the ATP/ADP ratio, suppression of ATP-sensitive potassium channels and activation of voltage-gated Ca2+ channels [4]. The resulting calcium influx allows exocytosis of insulin granules from the β-cells. The insulinotropic effect of AA administration in humans was studied in the 1960s by Floyd et al. [5,6]. An intravenous infusion of an AA mixture, consisting of essential l-AA, increased plasma insulin concentration and subsequently lowered blood glucose concentrations in healthy people [5]. A similar response was also demonstrated following infusion of single AAs [5,6]. Interestingly, however, there seemed to be large differences in the capacity of the various AAs to stimulate insulin secretion [5]. A synergistic effect of simultaneous glucose and AA ingestion was found in several studies, where co-ingestion of AAs with glucose increased insulin secretion more than the sum of the individual effects [6,7,8,9]. The insulinotropic effect of AA administration has also been demonstrated in patients with T2DM. For example, co-ingestion of a protein hydrolysate/AA mixture with carbohydrates induced a more pronounced increase in plasma insulin concentrations compared to intake of carbohydrates alone, not only in healthy people but also in patients with T2DM [9]. Of note, the metabolic phenotype may influence the magnitude of the glucose and insulin responses following ingestion of AAs.
Despite decades of research, there is no quantitative overview available that describes the effects of individual AAs on glucose and insulin kinetics in individuals with different metabolic phenotypes. These data are needed as the type and amount of AA intake, the administration route (i.e., oral versus intravenous) and study population seems to affect the insulin and glucose responses to AAs. We hypothesize that AAs exert distinct effects on glucose and insulin dynamics, which are further influenced by the metabolic phenotype as well as route of administration. A better mechanistic understanding would therefore allow for more targeted nutrition studies. This information could also aid in the improvement of physiology-based computational models of the glucose regulatory system, which have been developed and approved for pre-clinical research [10]. Therefore, we performed a systematic literature search and extracted the original data, which we made publicly available, to obtain better insight into the quantitative acute effects of individual AAs on postprandial glucose and insulin dynamics in humans, taking the metabolic phenotype into account”. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7594055/
***