Gelatina animal: um alimento-medicamento
A glicina, principal aminoácido da gelatina animal, possui poderes terapêutico-preventivos estratégicos
[Imagem: foodbay.com]
[Este artigo já foi publicado no nosso antigo blog do substack ao qual, recentemente, me foi vetado o acesso para postar novas publicações. Dessa forma e para que possa ser conhecido pelos leitores deste novo blog - intitulado outramedicina2024.substack.com - , faço aqui a republicação do artigo]
Nas origens, nos livros de medicina do século XIX, a gelatina era vista como uma proteína de má qualidade, muito pobre do ponto de vista nutricional. Mesmo assim, apesar de suas limitações aparentes, ela era muito utilizada na esfera do tratamento médico. E isso já vinha ocorrendo desde milhares de anos antes.
Chegou a ser considerada, em alguns lugares e por determinados agentes de saúde, como uma panacéia para problemas articulares, de pele, do trato digestivo e até cardiovasculares.
A medicina do século XX e do nosso século, mesmo a passo de formiga, vem estudando e revelando os poderes - para alguns, superpoderes – da gelatina animal e, em consequência, do seu principal aminoácido, a glicina. Os estudos avançam, embora os resultados não chegam nem às faculdades de medicina tampouco ao consultório médico.
A gelatina animal já foi tema neste blog - pela positiva - mais de uma vez. Em várias notas.
O artigo abaixo, assinado por cientistas chineses [A], é apenas um exemplo que evidencia propriedades notáveis da glicina na saúde humana. E animal.
A glicina cumpre um papel bem importante na regeneração neural, na biossíntese da glutationa, da heme, da creatina, ácidos nucleicos e ácido úrico.
Ela é um componente fundamental dos ácidos biliares lançados na luz intestinal, sem os quais fica comprometida a absorção e digestão de ácidos graxos da alimentação.
Previne dano nos tecidos, e é base para sua recuperação, também promove a imunidade [A].
Pode ser – se usada adequadamente – uma arma terapêutica contra obesidade, diabetes, doença cardiovascular, lesões de isquemia-reperfusão, várias doenças inflamatórias e câncer. E constitui um neurotransmissor não excitatório.
O papel da glicina na preservação da saúde intestinal, desinflamando a mucosa [inibindo ativação de mediadores inflamatórios e promovendo a síntese da protetora glutationa] já foi demonstrado em vários estudos, inclusive seu papel regenerador do intestino, ao aumentar a síntese proteica [B].
De passagem também já foi comprovado o papel da glicina de reduzir dramaticamente eventuais efeitos gastrintestinais da aspirina em pessoas mais sensíveis e promover sua melhor absorção. Ou seja, quem vai usar o AAS, estará melhor servido se utilizar, junto, gelatina animal [e vitamina K2MK4 e tomar o cuidado de misturar, antes de ingerir, o AAS, com um pouco de bicarbonato e água].
Considerando que muitos de nós não sintetizamos suficiente glicina para a demanda normal do corpo e que o consumo de músculos demanda muitíssimo mais glicina [para inibir a cisteína-metionina, aminoácidos inflamatórios], não pode haver dúvida que a gelatina animal/ glicina tem poder terapêutico inestimável. E que passa a ser um aminoácido que deveríamos consumir regularmente, sempre.
E que continuar minimizando o papel terapêutico e nutricional da gelatina animal como fazem a nutrição chapa e a medicina dominantes [que costumam propagandear que “glicina não é aminoácido essencial”], não contribui – sejamos eufêmicos – para a melhoria da saúde das pessoas nem para evitar certas enfermidades.
G Dantas [Publicado originalmente em Brasília, 31-12-23]
As informações aqui presentes não pretendem servir para uso diagnóstico, prescrição médica, tratamento, prevenção ou mitigação de qualquer doença humana. Não pretendem substituir a consulta ao profissional médico ou servir como recomendação para qualquer plano de tratamento. Trata-se de informações com fins estritamente educativos. Nenhuma das notas aqui presentes, neste blog, conseguirá atingir o contexto específico do paciente singular, nem doses, modo de usar etc. Este trabalho compete ao paciente com seu médico. Isso significa que nenhuma dessas notas - necessariamente parciais - substitui essa relação.
Referências ________________
[A] WANG W WUU Z DAI Z, 2013. Glycine metabolism in animals and humans: implications for nutrition and health. Amino Acids. 2013 Sep;45(3):463-77. doi: 10.1007/s00726-013-1493-1. Epub 2013 Apr 25. PMID: 23615880 DOI: 10.1007/s00726-013-1493-1 “Glycine is a major amino acid in mammals and other animals. It is synthesized from serine, threonine, choline, and hydroxyproline via inter-organ metabolism involving primarily the liver and kidneys. Under normal feeding conditions, glycine is not adequately synthesized in birds or in other animals, particularly in a diseased state. Glycine degradation occurs through three pathways: the glycine cleavage system (GCS), serine hydroxymethyltransferase, and conversion to glyoxylate by peroxisomal D-amino acid oxidase. Among these pathways, GCS is the major enzyme to initiate glycine degradation to form ammonia and CO2 in animals. In addition, glycine is utilized for the biosynthesis of glutathione, heme, creatine, nucleic acids, and uric acid. Furthermore, glycine is a significant component of bile acids secreted into the lumen of the small intestine that is necessary for the digestion of dietary fat and the absorption of long-chain fatty acids. Glycine plays an important role in metabolic regulation, anti-oxidative reactions, and neurological function. Thus, this nutrient has been used to: (1) prevent tissue injury; (2) enhance anti-oxidative capacity; (3) promote protein synthesis and wound healing; (4) improve immunity; and (5) treat metabolic disorders in obesity, diabetes, cardiovascular disease, ischemia-reperfusion injuries, cancers, and various inflammatory diseases. These multiple beneficial effects of glycine, coupled with its insufficient de novo synthesis, support the notion that it is a conditionally essential and also a functional amino acid for mammals (including pigs and humans)”.
[B] WANG W, WU Z, LIN G, 2014. Glycine stimulates protein synthesis and inhibits oxidative stress in pig small intestinal epithelial cells. J Nutr. 2014 Oct;144(10):1540-8. doi: 10.3945/jn.114.194001. Epub 2014 Aug 13. PMID: 25122646 DOI: 10.3945/jn.114.194001 Erratum in - Erratum for Wang et al. Glycine stimulates protein synthesis and inhibits oxidative stress in pig small intestinal epithelial cells. J Nutr 2014;144:1540-8.
[No authors listed] J Nutr. 2016 Sep;146(9):1813. doi: 10.3945/jn.116.236612.PMID: 27587752 No abstract available.
“Glycine has recently been classified as a nutritionally essential amino acid for maximal growth in young pigs. Currently, little is known about the metabolism or function of glycine in the neonatal intestine. This work was conducted to test the hypothesis that glycine has a protective effect against oxidative stress in intestinal epithelial cells. Jejunal enterocytes isolated from newborn pigs were cultured in the presence of 0.0-2 mmol/L glycine for measurements of glycine metabolism, cell proliferation, protein turnover, apoptosis, and antioxidative response. Compared with 0.0-0.5 mmol/L glycine, 1.0 mmol/L glycine enhanced (P < 0.05) cell growth (by 8-24% on day 2 and by 34-224% on day 4, respectively) and protein synthesis (by 36-419%) while reducing (P < 0.05) protein degradation (by 7-28%). This effect of glycine was associated with activation of the mammalian target of rapamycin signaling pathway in enterocytes. By using a model of oxidative stress induced by 30 μmol/L 4-hydroxynonenal (4-HNE), which was assessed by flow cytometry analysis, 1.0 mmol/L glycine inhibited (P < 0.05) activation of caspase 3 by 25% and attenuated (P < 0.05) 4-HNE-induced apoptosis by 38% in intestinal porcine epithelial cell line 1 cells through promotion of reduced glutathione synthesis and expression of glycine transporter 1 while reducing the activation of extracellular signal-regulated kinases, c-Jun amino-terminal kinases, and p38 protein in the mitogen-activated protein kinase signaling pathway. These novel findings provide a biochemical mechanism for the use of dietary glycine to improve intestinal health in neonates under conditions of oxidative stress and glycine deficiency”.
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